Resenha: “Um velho que lia romances de amor”, Luís Sepúlveda

24 01 2018

 

 

Le Douanier, O sonho, ostO sonho, 1910

Henri Rousseau, “Le Douanier” (França, 1844-1910)

óleo sobre tela, 204 x 298 cm

MOMA, Nova York

 

 

 

Não gosto de literatura criada com objetivo político, com a intenção de instruir, ensinar,  ilustrar um problema.  Literatura didática, com viés político ou social, destrói a potencialidade de execução de uma boa ideia.  Este é o caso de Um velho que lia romances de amor, do chileno Luís Sepúlveda, com tradução para o português de Josely Vianna Baptista. Uma ideia tão boa!  Uma apelo tão interessante, descoberto pelo próprio autor que diz; “ … e pôs-se a andar no rumo de El Idilio, de sua cabana e de seus romances que falavam do amor com palavras tão belas que às vezes o faziam esquecer a barbárie humana.” [94]  No entanto, gostar de ler romances de amor  para Antônio Bolívar, personagem principal desta novela situada na Amazônia equatoriana, é simplesmente um acidente de percurso, como poderia ser contar escamas de peixes ou fazer colares de sementes vermelhas.  É chamariz, um elemento decorativo na narrativa, secundário e não explorado. Luis Sepúlveda tinha uma ideia interessante nas mãos, muito boa mesmo, mas preferiu a dogmática posição político-social de defesa do meio ambiente, sacrificando no desenrolar da história a significância do mundo de devaneios e fuga que, pela leitura, podiam encapsular Antônio Bolívar, protegendo-o da rusticidade do mundo que habitava.

 

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Fora a restrição acima, essa pequena obra  se respalda em excelentes descrições da selva amazônica.  Luís Sepúlveda consegue desde o início dar a sensação do calor opressivo, a umidade asfixiante,  da muralha verde insuperável da jângal, da brutalidade necessária para a sobrevivência no matagal distante.  Alguns de seus personagens são um tanto caricaturais, como o coronel que insiste em adentrar a floresta de botas, ou até mesmo o dentista com suas diversas dentaduras prêt-à-porter.  Também achei a referência aos “bandidos” americanos, uma visão simplória do explorador, com viés político muito usado, que empobrece a causa defendida.  Em contrapartida, as descrições do povo shuar, indígenas que vivem na floresta amazônica entre o Peru e o Equador são magníficas.

 

luis sepulvedaLuís Sepúlveda

 

Esta é uma obra descomplicada, formulada com uma única ideia em mente: o abuso da exploração sem trégua da Amazônia. Tem a intenção de um romance de aventuras muito aquém de um clássico como H. R. Haggard de As Minas do Rei Salomão.  Ganha muito com os conhecimentos passados pelo convívio do autor com os índios shuar, durante sua estadia no Equador.  Como literatura é um trabalho trivial, com linguagem simples, enredo e narrativas sucintos.  Um velho que lia romances de amor se beneficiou bastante pelo momento em que foi lançado 1989,  mesma época do assassinato do brasileiro Chico Mendes, seringueiro e ambientalista, amigo pessoal do autor, a quem o livro, nesta edição é dedicado. É uma obra usada frequentemente nas escolas em alerta às questões ambientais.  No Brasil, foi publicado pela Ática, editora responsável por muitas obras paradidáticas. Não me impressionou.

Observação sobre esta edição: Capa de Ettore Bottini.  Em lugar nenhum deste livro se menciona que a capa tem a diagramação de Bottini, mas a obra retratada é um detalhe do quadro O sonho, do pintor francês Henri Rousseau (1844-1910). Só porque já está em domínio publico não alivia a responsabilidade da editora de identificar a obra principalmente quando o livro é fartamente usado nas escolas do país.

 

 

 

NOTA: este blog não está associado a qualquer editora ou livraria, não recebe livros nem qualquer incentivo para a promoção de livros.

 

 


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